Conto é uma narrativa curta, que
contempla um único conflito. Quando eu digo curta, quero dizer que não é tão
longo como uma novela ou um romance, mas podemos ter contos com 20, 30 páginas
– se contiver um único conflito, ainda assim será um conto.
O mesmo cuidado que precisamos
ter ao construir os personagens de um romance precisamos ter ao pensar nos
personagens do conto. Talvez não seja necessário fazer uma biografia do
personagem, dado que haverá um único conflito. Ainda assim, é importante pensar
em quem é esse personagem, quais as suas características mais marcantes, que
defeitos ele tem, o que o motiva/move.
Mais uma vez, vamos recorrer ao
PENTE:
1. Para criar personagens inesquecíveis, marcantes, precisamos nos atentar para alguns detalhes:
- Fuja do general
O mundo está saturado de
histórias contadas pelo ponto de vista do mais importante, do vencedor. Tente
contar a mesma história sob a ótica de alguém com menos visibilidade. Por
exemplo, numa narrativa de guerra, em vez de contar a batalha pelos olhos do
general, por que não escolher o descascador de batatas que foi recrutamento
“sem querer” pelo exército e que não fazia ideia de onde estava se metendo?
- Fuja do Capitão América
Personagens perfeitinhos podem
ser o padrão ideal de alguns escritores, especialmente os iniciantes. Mas eles
muitas vezes resultam em personagens chatos, com pouca identificação do
público. Para conseguir personagens mais reais, busque as imperfeições, os
defeitos, os traumas. Isso ajuda a formar uma base interessante e cria
curiosidade no leitor.
2. Preste atenção ao seu enredo:
- O que os personagens têm a perder
Quando pensar no conflito do seu
conto, pense em algo que esteja em jogo que signifique muito na vida do
personagem. Quanto mais estiver em jogo, maior a aderência do público. Imagine
uma menina que quer ganhar uma viagem num concurso – o que ela tem a perder se
não conseguir resolver seu conflito? Agora imagine que no local para onde ela
vai viajar mora um curandeiro, que promete uma poção de cura do câncer, o mal
que aflige sua mãe? A história fica muito mais interessante.
- Não se perca numa trama de conflitos
Caso você opte por fazer a
construção completa do seu personagem, cuidado para não se perder numa rede de
conflitos – se não, em vez de um conto, você vai acabar produzindo um romance
ou uma novela. É importante definir exatamente qual o conflito, o problema que
se pretende resolver na história.
3. Sob seu narrador, considere duas coisas:
- Primeira ou terceira pessoa:
Sua história vai ser narrada por
um dos personagens, ou alguém de fora da história o fará? E esse narrador é
onisciente (sabe tudo o que acontece, o que se passa mesmo na cabeça dos
personagens) ou é um mero observador da história? A escolha de um bom narrador
pode representar o sucesso ou fracasso na hora de contar uma história.
- Confiável ou não-confiável:
Uma estratégia interessante
quando contamos uma história é escolher se o narrador é confiável ou não. Se
ele for confiável, todas as informações repassadas ao leitor do início ao fim
do texto precisam ser verdadeiras, e estar devidamente amarradas para não
deixar furos. Já se você escolher um narrador não-confiável, ele pode contar o
que ele acha que aconteceu, e depois
demonstrar ao leitor que estava equivocado.
4. Com relação ao tempo da história:
- Presente ou passado:
Há, basicamente, duas formas
eficazes de narrar uma história: no presente e no passado. A diferença básica é
que no presente você cria uma espécie de suspense; é como se o leitor estivesse
com o narrador no momento em que as coisas estão acontecendo. Isso cria uma
tensão permanente em quem lê, porque, assim como o narrador, ele não sabe o que
pode acontecer. Já no passado, a leitura é normalmente mais tranquila. Claro
que é possível criar uma tensão quando a história é narrada no passado, mas, de
modo geral, o leitor deduz que o narrador não vai morrer no curso da história,
já que ele está narrando algo que aconteceu no passado. Igualmente, só é
possível criar momentos de suspense narrando no passado se o narrador ocultar
alguns fatos, já que no futuro onde ele se encontra, ele já sabe o que
aconteceu.
- Não misture os tempos:
Um dos erros mais comuns do
escritor iniciante é começar uma história no presente e depois passá-la para o
passado, e voltar ao presente. Veja bem: eu não estou me referindo ao tempo da
história – esse, sim, pode ir e voltar conforme os desejos do escritor. Estou
falando dos verbos usados no texto.
Maria acorda e vai ao banheiro. Escovou os dentes, bochechou enxaguante
bucal. Depois vai à escola sem tomar café da manhã.
5. Não se esqueça do espaço:
- Um único lugar:
Como o conto é uma narrativa
curta, normalmente ele apresenta a história num único espaço. Claro, é
possível, dependendo da trama, que os personagens precisem ir de um ponto a
outro, de um lugar a outro. Mas lembre-se: isso só deve acontecer se houver um
motivo na história para que eles se locomovam.
- Só descreva o que for pertinente:
Como regra geral, evite longas
descrições (de espaço ou mesmo de personagens). Na modernidade, é mais comum
apresentar nos textos apenas as informações que sejam relevantes ao andamento
da história. Assim, não comece um texto falando que havia uma escola onde
meninos e meninas estudavam separados, em alas divididas por uma cerca, se
depois você for contar o drama de uma menina órfã que não tem relação nenhuma
com o fato de não ter meninos no seu lado da escola.
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