terça-feira, 12 de abril de 2016

Emagrecência


Perdi dez quilos em exatos 78 dias. As roupas ficam mais frouxas, o rosto aparenta mais fino. É uma mudança estética, superficial e externa. Por dentro, continuo do mesmo tamanho.

É curioso definir o que somos. Como matéria física, não sei dizer com precisão como me sinto. Se seguir os rótulos sociais, o título de gorda basta. O caso é que não me sei gorda. Deixe-me explicar.

Por uma questão de inconsciente coletivo, a matemática é simples: se você come mais calorias do que é capaz de gastar, sua massa aumenta. Assim, para diminuir, você precisa comer menos ou gastar mais energia – talvez ambas as coisas. Mas o fantástico da vida é que nem tudo se resume à matemática. Há tantos fatores envolvidos quando falamos do corpo – e, no meu caso, caloria é o que menos conta.


No espelho, a imagem refletida nunca condiz com o número que me mostra o marcador da balança. O reflexo não é capaz de mostrar todas as nuances do meu ser. Não há azul no cabelo, não há críticas da sociedade. Os padrões de hoje, esquálidos, em muito diferem das curvaturas voluptuosas da década de 1950. Mudaram as mulheres ou mudou a cobrança?

Tirando alguns inconvenientes que o excesso de peso me traz, como não encontrar as roupas que eu gosto nos tamanhos que eu preciso, ou aquela dorzinha que me alfineta o joelho de vez em quando, não sei quantificar o desconforto de ser gorda. Se nossa verdade é aquilo em que cremos, sou tudo menos gorda. Sou do tamanho dos meus sentimentos, das minhas memórias coloridas ou acinzentadas, da música que me carrega a alma e das letras que eu carrego por dentro.

Sou do tamanho das dores que engulo todos os dias, junto com o almoço ou o jantar. Sou o gás da coca-cola chiando, o veneno dos embutidos e defumados, o frescor da salada de frutas; o ardido, o azedo, o amargo e o doce. Sou cada festa que os sapatos me dançaram, cada cócega de espumante no nariz. Sou brilho de paetê, pigmento colorido no cabelo, sou renúncia e ausência – porque a não-escolha é também uma escolha. Sou resultado de tudo o que vivi, e disso sim estou gorda, estou farta, estou plena.

Que cada mulher possa amar tudo aquilo que lhe preenche a matéria, porque o que nos importa, mesmo, é nossa mais pura essência!

Andreia Evaristo
Crônica publicada no Jornal A Notícia, em 02 de abril de 2016.

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