quinta-feira, 28 de abril de 2016

Como escrever diálogos

Imagem: Freepik

O diálogo, num texto narrativo, tem basicamente três funções:

* caracterizar o personagem;
* apresentar a situação;
* levar a história para a frente (lembre-se: as histórias normalmente vão do ponto A ao ponto Z).

Se o diálogo do seu texto não cumpre nenhuma dessas três funções, pergunte-se: ele é mesmo necessário? Seu texto não ficaria melhor caso o diálogo fosse cortado?

Muitos escritores iniciantes ficam em dúvida sobre seus diálogos, dizem que eles parecem artificiais. Se você acha que um diálogo está artificial, é porque, provavelmente, está. Isso acontece quando iniciamos um texto e ainda não temos muito claro quem são os personagens da trama. Conforme a história avança, é comum que os diálogos se tornem mais naturais na mesma proporção em que os personagens criam vida dentro de sua mente, dentro de sua história. Então, é a hora de retomar os diálogos do início e reescrevê-los.


Pecados na hora de escrever os diálogos


Como escritor consciente, é necessário que você perceba o que serve e o que não serve na sua história. Mas alguns erros são comuns a quem começa. Vejamos:

  1. Uso de identificadores


Sabe aquelas expressões usadas no texto que indicam quem é que está falando? É importante que elas apareçam, mas nunca em excesso. Tais indicadores devem ser o mais invisíveis possível. Assim, num diálogo entre um homem e uma mulher, nem sempre é necessário usar disse ele ou disse ela. Veja:

“Você está linda hoje.” – se a outra pessoa é linda, quem fala aqui é o homem.
“Muito obrigada.” – quem responde é a mulher.

Num diálogo mais longo, entre duas pessoas, basta identificar a primeira vez que aparece:

“O Cícero precisa que você troque de calça jeans com ele”, me disse o Pedro.
“O quê?” Eu realmente não conseguia acreditar no que eu estava ouvindo.
“Sim, você saiu de casa tão ansiosa que nem percebeu que pegou a calça nova dele e veio para cá. Como ele quer usar a calça nova, você precisa trocar de calça com ele.”

Na primeira vez que Pedro fala, a narradora o identifica. Na segunda, ela se identifica. Na terceira fala, ela não diz nada, mas deduzimos que se trata novamente de Pedro.

O problema maior está em quando há mais de duas pessoas no diálogo. Aí é necessário identificar cada uma das pessoas que fala, para não gerar dúvidas. Contudo, faça isso da forma mais simples que conseguir. O leitor não deve prestar atenção ao como você escreve, mas na ação que esteja acontecendo.

No diálogo a seguir, temos uma conversa entre três amigas: Maria Clara, Gabriela e Juliana (que é a narradora). Maria Clara acabou de contar um segredo às amigas. Veja:

“Mas, Clara, você contou pra sua mãe?”, perguntou a Gabriela.
Ela nos olhou como se não fôssemos deste mundo.
“Nem pra minha mãe, nem pra ninguém! Tá maluca? Meu pai não pode nem sonhar que isso aconteceu! Eu sou proibida de namorar, lembra?”
Eu não sabia o que dizer. Esse devia ser um fardo muito difícil para carregar; sozinha, o que tinha acontecido era pior que o meu pior pesadelo. Quando, enfim, retomou um pouco a calma, Maria Clara olhou seriamente para mim.
“Promete que vai tomar cuidado, Ju? Promete? Ninguém merece passar pelo que eu passei.”
Eu prometi.

Note: não é preciso identificar todas as vezes quem é o personagem que está falando. Não subestime seu leitor.

  1. Lugar comum? Fuja!


Sabe aquelas coisas que a educação nos obriga a dizer? Elas não são necessárias na história. Vai por mim: ninguém precisar começar um diálogo com Oi, tudo bem? Tudo, e você? Bem, também. Lembre-se: sua história deve ser uma simulação da realidade, não ser a realidade.

Isso quer dizer que eu sou proibido de colocar essas coisas? Proibido, não. Nada é proibido em literatura. Mas pense bem: isso agrega alguma coisa à sua história? Se não agregar, é bom cortar.

Algumas vezes, esses inícios de conversa servem para caracterizar um personagem, se é carinhoso, se é nervoso, se usa muitas gírias... Nesses casos, dá para aproveitar.

Há escritores que precisam desse tipo de início em seus diálogos para “entrar” no clima. Se este for o seu caso, uma boa dica é escrever esses inícios, e depois cortá-los.

  1. Diálogo informativo / didatismo


Imagine o seguinte diálogo:

– Ok... Mas qual era a proposta mesmo?
– Ah, sim. Eu acho que nos podemos ter um negócio. Você pode vender meu produto para pagar seu próprio consumo. O que acha?
– Você está sugerindo que eu trafique?
– Exatamente.
– Tá maluco. Onde é que eu venderia essas coisas?
Você sabia que segundo o IBGE são os adolescentes que usam mais drogas ilícitas aqui no Brasil?
– Não.

A informação que está em vermelho estaria na boca de um traficante? Qual a utilidade dela na cena? Você não precisa usar os diálogos para ensinar nada ao leitor.


Da mesma forma, usar diálogos para explicar algo existente na trama só funciona se o personagem não conhecer a informação. Pensemos em Harry Potter. Faz sentido ele perguntar uma série de coisas sobre Hogwarts e o mundo dos bruxos, porque ele desconhecia totalmente esse universo. Se Rony fizesse as mesmas perguntas, seria descabido, visto que ele vem de uma família de bruxos.

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