quinta-feira, 3 de março de 2016

Uns mais iguais que os outros

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Dia de festa. O salão se exibia imponente, com a entrada ricamente adornada por dois arranjos de flores vermelhas, que se erguiam à altura de duas pessoas. Mesas com finas toalhas de estampa barroca, tom sobre tom, ditavam a elegância que se espera numa data como essa. Os formandos começaram a entrar, um a um, embalados pelo trecho de música que melhor lhes representava a própria vida. Feito o brinde, deu-se início ao baile.

Em ocasiões solenes, máscaras – politicamente corretas ou não – são ostentadas com pomposidade e orgulho e, ao menos no início da festa, ninguém é de verdade. Ninguém é cotidiano, ninguém é chinelo no pé. No início da festa, somos todos personagens que nós mesmos criamos, sem jamais ensaiarmos para a estreia, mas que nos empenhamos em atuar para o mundo, em selfies no instagram que demonstram o quanto nossa vida é bacana e nossa felicidade, contagiante – e o quanto nossos amigos virtuais deveriam nos invejar, porque temos tudo o que eles gostariam de ter (e nós também).

Olho ao redor, na tentativa de buscar alguma verdade nesse teatro. Na pista, mulheres dançam em roda. São todas iguais: cabelos longos, alisados com chapinha ou progressiva. A maioria dos cabelos são loiros, ou possuem mechas ou luzes. A maquiagem é padrão: cílios postiços, olhos marcados com cut crease escuro, sobrancelhas perfeitamente desenhadas, e batom mate de cor vibrante. Sem qualquer diferença, todas usam um vestidinho preto indefectível, como cantaria Samuel Rosa, e salto alto. Todas plastificadas, moldadas à luz da tendência indicada pela mídia.

Não sei se fala minha alma contrária à massificação das pessoas, ou se é a alta do álcool no sangue quase sem carboidrato que me afeta os freios, mas tenho vontade de gritar contra essa epidemia de mulheres robôs feitas em forma, falando igual, dançando igual, gostando das mesmas coisas, dizendo as mesmas coisas. Pior: pensando as mesmas coisas. Decido me calar, até que a coceirinha na língua recomeça e não posso evitar:

“Marido, já percebeu que as mulheres são todas iguais?”

Ele olha ao redor e deita-me um beijo junto aos cabelos roxos, curtos e encaracolados, enquanto a mão repousa sobre o vestido com estampa de onça:

“Nem todas.”

(Andreia Evaristo)
Publicada no jornal A Notícia, em 27 de fevereiro de 2016.

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