sábado, 9 de janeiro de 2016

Faxina de Ano Novo

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Eu sei que você está aí, à beira-mar, desfrutando uma cerveja suada como seu corpo ao sol. Eu sei, porque está lá, para quem quiser olhar. Também sei que você deseja que o novo ano lhe traga dinheiro e paz, dado ao amarelo e ao branco presentes na sua foto de ontem. Você corre atrás de curtidas, mas está mesmo curtindo cada momento?

Passei a virada nua, esperando da vida, apenas, colher no ano novo tudo aquilo que plantei no ano velho. Cores me amarrariam a uma sorte apenas, mas eu quero muito mais. Não quero meu destino traçado por superstições nem um mapa astral a me indicar os caminhos; quero, antes, um gps e um off-road para que eu possa ir aonde meus instintos me levarem.

No primeiro dia do ano, nada de imagens enfeitadas para pendurar nos murais virtuais – apenas uma grande faxina, daquelas há tanto prometida e nunca cumprida. Abro a geladeira e a alma e jogo fora tudo o que guardei para depois, mas que se perdeu na espera do momento perfeito. Abro o armário e o coração e descarto as roupas e memórias que nunca mais serão usadas. Há uma nostalgia em cada uma delas, mas não me servem mais. Remexo em cada canto da minha morada, em busca de teias de aranha e bolores que precisam ser exterminados do ano que se inicia.

Com a faxina pronta, lavo o corpo e o espírito em água quase fria, enquanto um raio de sol entra pela pequena janela do banheiro. Sorrio ao me lembrar de quando eu era criança, e todos os banhos eram amarelos e iluminados (já que hoje são sombrios e madrugados).

O espelho me mostra que eu já não sou quem eu era antes, quando tudo me guiava para um caminho que fora escolhido para mim, mas não por mim. O tempo marcou-me o rosto e me obriga a lembrar que ou eu passo por ele, ou ele passa por mim. Balanço os cabelos molhados. Já fui loira, morena, ruiva. Já deixei de ser todas elas, mas não posso deixar de ser eu mesma – com a liberdade única de deixar os cabelos dançarem com o vento. Que nenhuma regra obrigue a usar salto um pé que deseja um par de chinelos. Que todas as regras possam ser quebradas, subvertidas, para que eu não deixe de ser eu mesma.

Mesmo sem imagem para os holofotes virtuais, que essa felicidade de ser quem eu sou possa contagiar quem está aí do outro lado. Feliz ano novo!

(Andreia Evaristo)
Crônica publicada no dia 02 de janeiro de 2016, no Anexo do jornal A Notícia.

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