A rotina mata o amor. A frase lhe martelava a mente. Não sabia se concordava com ela. As experiências sensoriais do início do namoro haviam se perdido em 16 anos juntos. A vida toma um rumo que não corresponde exatamente aos nossos sonhos e, quando menos percebemos, estamos vivendo uma vida igual à que viviam nossos pais – aquela que recusávamos. Mas o roteiro vem pronto e, de repente, estamos atolados num sitcom americano, com contas para pagar, mercado nos fins de semana, casa para limpar, roupa para lavar. O tempo fica curto e o desejo de explorar a vida com todas as células vai sendo guardado num baú escondido da alma, com chaves e ferrolhos.
Pensava em sua vida: o amor estava lá, tinha certeza. Talvez um velhinho encarangado, precisando de muleta e óculos grossos, mas vivo ainda. Quando é que se pode dizer que o amor foi morto? Pensou no marido, sentado no sofá, no fim do dia, com cara de quem queria se desligar do mundo de fora e se meter pelos fios que lhe emaranhavam os pensamentos de dentro. Pensou nas festas, cada vez mais raras, quando ela ainda podia usar saltos e maquiagem. Poucas, mas existiam. Precisava se agarrar a qualquer resquício de sonho encantado que pudesse lhe faiscar.