domingo, 19 de junho de 2016

Essa tal de empatia


Vivemos a era das selfies: 90% dos brasileiros tiram fotos de si mesmos, e são essas as fotos mais curtidas. É um mundo de egolatria.

Essa busca por aceitação social nas redes pode tornar-se compulsiva. É uma disputa invisível entre quem tem mais likes, mais compartilhamentos, mais fama – mesmo que vazia e momentânea. Esses dias, conversando com um aluno, mostrei a ele uma foto no celular e fiz um comentário totalmente inocente: “viu quantos likes?” Ele nem pestanejou: “Pois é. E nem está pelada.”

Pior do que seu comentário é constatar que ele tem razão: todos os dias, em busca dessa popularidade fácil que as redes sociais podem trazer, pessoas fazem o inimaginável para conseguir espaço: expõe-se nudezes impróprias de meninas adolescentes, estapeiam-se os meninos a ponto de terem a pele marcada pelos dedos alheios... Vi um garoto que chegou ao cúmulo de encher a cueca com cubos de gelo, enquanto eu me perguntava “Por que, meu pai, por quê?”

Por onde anda essa tal de empatia? Essa coisinha linda e delicada que tem sido deixada de lado, esquecida no canto de um quarto escuro, como se estivesse de castigo por ter feito algo errado. Olhamos demais para nossa imagem, e estamos nos esquecendo de olhar para o outro.

Nossos dedos ágeis de manusear dispositivos eletrônicos são rápidos demais em apontar os defeitos do outro. Vagabunda! Viadinho! Marginal! (somem-se aqui outras ofensas que não caberiam numa selfie). Se olhássemos de verdade para o outro, talvez pudéssemos compreender que motivos os levaram às decisões que tomaram. Você conhece as dores do outro? Já trilhou o mesmo caminho, com os mesmos sapatos? É muito fácil condenar à fogueira uma bruxa, desde que ela não seja minha amiga, minha mãe, ou quem sabe eu mesma.

Uma coisa que tenho aprendido com meus personagens – sim, porque personagens me ensinam muito – é que tudo o que alguém faz tem uma motivação. Suas dores, cicatrizes, máculas e traumas, aliados aos seus valores e crenças, são o que transformam você na pessoa que você é. E você não tem como fugir da sua história.

Olhe para si. Você não é a perfeição da sua selfie, com todos aqueles filtros que escondem a verdade. Você não pode ser medido pelo número de curtidas ou de seguidores. Você é o que acredita ser. Vamos levantar uma bandeira: por um mundo com menos selfie e mais espelho em casa, por favor!


(Andreia Evaristo)
Publicada no jornal A Notícia, em 18 de junho de 2016

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